Eu falo de amor e da perda. Sempre, do sofrimento, do apagamento; você sabe o que é ver o seu amor nos braços de um outro qualquer?
Falo da perda da individualidade, quando você ama tanto que já não se vê mais, não tem individualidade, quer tanto o outro, necessita tanto do outro, quer ver o mundo pelos olhos dele, entrar dentro dele, onde ele anda, o que come, com quem fala ao telefone, o que diz no telefone, o que escreve na Internet, o que faz em casa, e aí, a gente se esquece de si próprio e é a hora de parar, de se olhar no espelho e retornar a auto estima, reaprendendo a amar: você não é mais presença, e sim REFLEXO.
Eu falo da perda de limites (pelo amor), da desconstrução da identidade (de novo), do espelho que é você refletido do OUTRO, você pensa...
Eu falo do vazio que é estar sem o outro, a solidão e o silêncio, da falta de capacidade de se bastar, de ler um livro ou ir ao cinema, não: nada disso importa quando você está tomada pelo amor excessivo, uma febre que consome! Eu falo da co-dependência afetiva, você já não come direito, dorme aos poucos, acorda na madrugada e lembra de uma canção antiga da Dione Warwick, ou de Pablo Honey do Radiohead e chora e chora e chora e acorda com os olhos vermelhos e inchados.
Eu falo da posse dos pensamentos, do olhar, adivinhar seus movimentos, andar por seus passos, respirar o que respira, o que pensa, entrar nos seus olhos…com quem ele sonha, com o que ele sonha...você passa a procuração de todos os seus atos... você tenta sair e não consegue, é como uma droga doce e cruel que te toma inteiro, então você sabe o motivo porque pega os comprimidos pra dormir, doida que o dia acabe e que no próximo você receba um telefonema (você ouve seus telefonemas invisíveis e tem longos assuntos imaginários)-sonha por uma mensagem na Internet dizendo, “vem me ver”, um torpedo celular... vem me ver, mas nada, a pessoa já está em outro lance e você não percebe que na real você também foi “só um lance”- você não quer acreditar que o perdeu, todos seus amigos já sabem mas não podem te dizer e aí quer mudar de país, sair do planeta e de novo procura a caixa de antidepressivos, não pra dormir mas sim pra apagar…Cada post dele na rede é uma sentença, e você os lê como quem escuta vozes-um oráculo- em sinais que não foram feitos pra você. Mas lê- de novo, como uma droga-porque tudo que vem do outro ainda tem cheiro de casa. Você quer se iludir, com uma volta, sonha com mensagens no whats que nunca vêm…
Eu falo do que falávamos na praia e sempre que estamos juntos, desde que nos conhecemos quando eu tinha 17 anos e você 14- idades que não contam, mas marcam-naquela viagem de trem e a pé pro Sul: do amor, da perda, de como é bom ser amado, quando o amor começa ele é igual pros dois e quando acaba sempre, quase sempre, termina pra um só -o outro ainda está lá, esperando um gesto, um sinal, uma lembrança- e a gente sofre, procurando a alma gêmea pelos cantos... eu pergunto, alma gêmea é idêntica à gente ou aquela que te completa? É igual ou é complemento?
Eu achei que tinha encontrado a tal, só que ela era a minha cara, meu espelho- meu reflexo invertido- (naquele tempo!), canalha e irresponsável e egoísta com o amor...E esse espelho, Inajara, não devolvia nada. Só roubava a imagem. Mas naquele tempo, eu achava que amar era se ver no outro. Hoje sei que amar é se perder um pouco, mas não se apagar. A alma gêmea talvez não exista. Ou talvez seja você, quando finalmente se reconhece sem precisar de reflexo.” Eu sou um Outro”
Inajara e Byra Dorneles na praia de Bambuí RJ.
Então você esquece tudo e pensa em encontrar um novo amor, vai ser tudo de novo? Talvez mais lento. Vai amar aos poucos? Pode-se amar devagar e com medo? Existe isso? Aí você lembra de uma canção com a Nana Caymmi que diz:” o amor quando acontece a gente esquece que já sofreu um dia...esquece SIM!” Você acredita. Quer acreditar. E esse querer já é quase amor.
Inajara,
Esse texto é obviamente prá ti e pra Tiza, nossa querida tia, que amou muito e nunca temeu nada.
Byra Dorneles
(Ex-calafate, ex-faxineiro da SQS 105 Brasília, é autodidata e escritor diletante, mas quer sair do nicho)
Leia com os fones no ouvido. A Play Lista "Carta aberta à Inajara" começa agora. E talvez um novo amor também…porque o amo quando acontece….ah você já sabe!!!!
Vasculhando o baú do passado, dentro de um álbum de fotos, achei esse poema no meio de umas cartas que trocamos quando eu morei em Brasilia em 74- sim, sobre um amor - e pela letra me parece ser seu:
Letra: Inajara Tavares
Baixo, bateria e arranjo by Carlos Salles: Carlos’s SubstackVoz: Byra Dorneles
Ediçao final video: Joao Miguel Sill.
Esse substack será sempre gratuito mas considere me pagar eventualmente um café!
Pix: sill.joao@gmail.com
Ina,
Como na canção Better Days do Graham Nash:
Quando seu amor se afastou | Você deve enfrentar a si mesmo e deve dizer
Eu me lembro de dias melhores | Não chore porque ele se foi
Ele está apenas seguindo em frente| Perseguindo espelhos através de uma névoa
Agora que você sabe que não está em lugar nenhum…